quarta-feira, 18 de outubro de 2023

O Caveira resenha: THE BURNING ("Chamas da Morte", 1981)

 

Se alguém perguntar se você sabe o nome daquele filme de horror que tem um maníaco homicida desfigurado, que promove uma chacina de adolescentes libidinosos num camping de verão à beira de um lago, provavelmente você responderá: "Sexta-Feira 13". 

Mas quem disse que só o bom e velho Jason pode fazer matanças vingativas em campings?The Burning está aí para provar o contrário, e o faz com muita propriedade. Em certos momentos, o espectador quase sente que descobriu algum episódio perdido da longa franquia Sexta-Feira 13, tamanha a semelhança de locações, ambientação, feeling e até de cenas específicas.


Mas calma aí antes de rotular The Burning como sendo apenas "uma imitação barata de Sexta-Feira 13". A bem da verdade, os primeiros esboços do roteiro deste filme já circulavam pelos bastidores da indústria desde 1979 (um ano antes da estreia da primeira película da famosa franquia de Jason). Vale lembrar que, antes do surgimento da icônica franquia do assassino da máscara de hóquei, as histórias de serial killers maníacos já estavam em alta nas produções hollywoodianas depois do sucesso de O Massacre da Serra Elétrica (1974) e do mítico Halloween (1978) de John Carpenter.

De qualquer forma, apesar disso, parece seguro dizer que o sucesso do primeiro Sexta-Feira 13 (1980) foi importante para viabilizar a realização de The Burning, e as comparações deste filme com os dois primeiros Friday the 13th são inevitáveis - ainda mais levando em consideração que The Burning foi lançado nos cinemas apenas sete dias depois de Sexta-Feira 13 Parte 2!

Apesar de ter sido completamente ofuscado pelo sucesso da franquia Sexta-Feira 13 na época, não é à toa que a reputação de The Burning foi progressivamente aumentando ao longo das décadas seguintes. Seja pela fotografia, pelos sustos eficientes, pelo ritmo excelente ou pelo ótimo trabalho de efeitos práticos, seria difícil não admitir que o filme merece ser considerado como um dos melhores slasher movies dos anos 1980 (a década de ouro do gênero). 


Estas qualidades técnicas também não decorrem de coincidência: na equipe responsável por The Burning, temos o lendário mago dos efeitos práticos de horror Tom Savini (que integrou a equipe técnica do primeiro Sexta-Feira 13). A edição ficou a cargo de Jack Sholder (que logo depois iria dirigir o interessante Alone in the Dark - resenhado semana passada aqui na Cripta do Caveira - e o controverso A Hora do Pesadelo 2). A música ficou a cargo do lendário tecladista do Yes, Rick Wakeman. 


E vamos à trama: em uma certa noite, no camping Blackfoot, um grupo de imbecis juvenis resolve sacanear o zelador do lugar - um alcoólatra abusivo conhecido como Cropsy. Um dos adolescentes entra na pequena cabana de Cropsy enquanto o sujeito dorme e coloca em cima da cama dele uma caveira coberta de vermes e com velas dentro. 

 


O zelador acorda apavorado, o fogo acaba se alastrando, as chamas atingem alguns produtos inflamáveis na choupana e eis que, em questão de segundos, Cropsy é transformado numa bola de fogo ambulante e posteriormente vai parar no hospital, severamente desfigurado pelas queimaduras.


Cinco anos depois, Cropsy recebe alta e começa a sua jornada de vingança e matança. Alheios a tudo isso, um outro grupo de jovens descolados, bem humorados e sedentos de sexo está curtindo as férias de verão no camping Stonewater, próximo ao local em que Cropsy foi assado vivo anos atrás. Entre os irreverentes mocinhos do filme, está o amigável Dave (Jason Alexander, em sua estreia na carreira de ator, oito anos antes de começar a brilhar na TV como o George Constanza da famosa série Seinfeld), o tímido Woodstock (Fisher Stevens, mais conhecido por seu trabalho nos dois filmes da série Short Circuit nos anos 80), a mocinha comportada Michelle (Leah Ayres, a namorada do Van Damme em O Grande Dragão Branco) e o esquisitão pervertido Alfred (Brian Becker, mais conhecido por seus papeis em Loucademia de Polícia IV e Picardias Estudantis).


Estabelecida a premissa, o resto do filme é aquela conhecida fórmula padrão dos slashers dos anos 1980: nudez feminina gratuita, cenas brutais de assassinato, sequências de suspense que não dão em nada e que só estão ali para despistar a atenção do espectador ("ah, é você? Você me assustou!"), mais garotas nuas, insinuações sexuais variadas, muita alegria e descontração da animada turminha jovem (até que, faltando vinte minutos para acabar o filme, a galera FINALMENTE começa a perceber que está sendo MASSACRADA), a revelação do assassino, o combate final com o vilão e fim da história. 


No entanto, toda essa tradicional receita de bolo é levada adiante com máxima competência. Os sustos funcionam, os efeitos visuais são excelentes, as mortes são brutais, a fotografia do filme é ótima, a ambientação é perfeita e as atuações são realmente adequadas e divertidas. Não há monotonia, não há pausas, não há marasmo: é uma hora e meia de diversão slasher realizada com maestria. O que não entrega em originalidade, The Burning entrega em execução.


 O Caveira recomenda! 💀💀💀💀



 

domingo, 8 de outubro de 2023

O Caveira resenha: ALONE IN THE DARK (1982)

 

E cá estamos, nos aproximando de mais um halloween - a época do ano favorita do Caveira que vos fala. Vai ter maratona de filmes de horror antigos? Mas é CLARO que sim! Tudo devidamente resenhado aqui na Cripta. Vamos começar com ALONE IN THE DARK, de 1982, dirigido por Jack Shoulder.

Oh, boy, esse aqui estava na minha lista há décadas! Na última madrugada, finalmente assisti essa pouco lembrada antiguidade.

 

A primeira vez em que ouvi falar de Alone in the Dark (não confundir com a série de games de mesmo nome) foi lá por volta de 1996, por meio do meu exemplar do bom e velho Guia de Vídeo Terror da Editora Escala, de autoria do Guilherme de Martino. Vamos ver o que o livrinho tem a dizer sobre este filme (que foi distribuído aqui no Brasil com o título "Noite de Pânico"):

"Três assassinos fogem de um manicômio e invadem a casa de uma família. Ponto de partida comum, na onda do sucesso de 'Sexta-Feira 13', mas com resultado interessante. Nada de novo ou original, mas um thriller envolvente com bom elenco."

 
O Guia Terror deu apenas duas estrelas (de um máximo de cinco) para o filme. Acho que é uma avaliação um pouco severa demais. Eu daria pelo menos três estrelas. "Alone in the Dark" realmente não reinventa a roda, mas o elenco é fantástico e o ritmo é muito bom. É uma ideia simples porém muito bem executada.

 

Na trama, o psiquiatra Dan Potter (vivido por Dwight Schultz, famoso nos anos 1980 por seu papel como o Murdock da clássica série "Esquadrão Classe A") é indicado para trabalhar em um hospital psiquiátrico conhecido como The Haven, chefiado pelo excêntrico e audacioso Dr. Leo Bain (interpretado pelo saudoso Donald Pleasence - o Dr. Loomis do "Halloween" original de 1978 e o presidente dos Estados Unidos no clássico "Fuga de Nova York" de 1981). 


Neste estabelecimento, existe uma ala de segurança eletrônica reforçada no terceiro andar, que abriga quatro assassinos potencialmente perigosos: o ex-militar Frank Hawkes (vivido pelo grande Jack Palance, conhecido pela minha geração aqui no Brasil por ser o apresentador da versão dos anos 80 do programa "Acredite se Quiser", bem como por sua participação no icônico "Batman" de Tim Burton), um maníaco sexual gordão chamado Ronald Elster, o ex-pastor Byron Sutcliff (interpretado por Martin Landau, nesta que talvez seja a atuação mais afetada e tresloucada de toda a carreira do ator) e, por fim, o enigmático John Skaggs, conhecido como "Bleeder" ("Sangrador").

 

Até aí, tudo tranquilo. O problema é que essa ala psycho killer do hospital psiquiátrico fica indignada com a chegada do novo Dr. Dan Potter. A inconformidade chega ao ponto de Hawkes convencer seus sinistros colegas de terceiro andar que, na verdade, o antigo psiquiatra deles teria sido "assassinado" pelo Dr. Dan. Nasce, aí, um desejo de sangue e vingança. 

 

                           

Para conveniência do roteiro (e alegria do espectador), essa revolta silenciosa do quarteto de assassinos se converte em fuga quando, após um blecaute prolongado, todo o sistema eletrônico de segurança de The Haven é desativado. Pronto: tá feita a merda! O resultado, por óbvio, é muita sanguinolência.

 


Só a oportunidade de ver simultaneamente na tela os veteranos Palance, Landau e Pleasence já seria motivo mais do que suficiente para dar uma chance para este filme. Mas ver Palance e Landau como serial killers torna tudo muito mais único e divertido. 

 

O então jovem Dwight Schultz se sai muito bem no papel de "mocinho" também. Destaques, ainda, para uma pequena ponta da veterana Lin Shaye (hoje mais conhecida pelos fãs de filmes de horror por conta de seu papel na franquia "Sobrenatural"), e para as divertidas performances da banda punk "Sic F*cks" (tente não rir ouvindo a hilária pérola "Chop Up Your Mother").

 

                     

 O Caveira recomenda! 💀💀💀


"Garota, me contaram que você falou mal de 'Tango & Cash' ... é verdade isso?!?"
 

domingo, 23 de abril de 2023

O Caveira resenha: METALLICA - 72 SEASONS (2023)

Me tornei fã do Metallica no já longínquo ano de 1996, rendido de imediato ao poder mesmerizante do clássico "Black Album" lançado em 1991. Como alguém que viveu aqueles dias, posso atestar que os anos 1990 foram uma época maravilhosa para ser fã da banda. Como todo mundo sabe, os trabalhos lançados pelo grupo no período estão longe da aclamação universal tão característica dos álbuns lançados na primeira década da banda. Desde os 90s até os dias atuais, muita gente torce o nariz para álbuns como "Load" (1996), "Reload" (1997), "Garage Inc" (1998) ou o ao vivo com orquestra "S&M" (1999). Mas, independentemente da sua opinião pessoal sobre estes álbuns, é inegável o fato de que foi uma década extremamente produtiva para a criatividade da banda. Foram nada menos do que três álbuns de estúdio lançados em seis anos, entre 1991 e 1997.

A partir dos anos 2000, ser fã de Metallica passou a demandar maior dose de paciência. Esperar meia década (ou mais!) por um novo disco de estúdio da banda passou a ser algo natural. Foram seis anos entre "Reload" e "St. Anger" (2003), cinco anos entre "St. Anger" e "Death Magnetic" (2008), oito (!) anos entre "Death Magnetic" e "Hardwired ... to Self Destruct" (2016) e agora mais sete anos entre o disco anterior e o novo "72 Seasons". Definitivamente, em termos de produtividade criativa, não estamos mais diante da mesma banda que, no espaço de apenas oito anos (1983-1991), lançou cinco dos álbuns mais aclamados e cultuados da história do rock em geral e, sobretudo, do heavy metal.

Mas, se álbum novo de estúdio do Metallica passou a ser um fenômeno raro pelo qual aguardamos como se fosse o retorno do Cometa Halley à Terra, por outro lado não faltam elementos para deixar os fãs da banda com um sorriso no rosto. Primeiro, porque a banda está envelhecendo maravilhosamente bem em termos de perfomance ao vivo - como pode ser atestado pela recente passagem dos caras pelo nosso país em 2022. Segundo, porque não faltaram ótimos lançamentos ao vivo do grupo nas últimas duas décadas, entre os quais vale destacar "Orgullo, Pasión, y Gloria" (2009), a mistura de show com filme de horror "Through the Never" (2013) e o audacioso "S&M2" (2019).

Mas há um terceiro ponto, tão ou mais importante. Embora cada vez menos frequentes, os álbuns de estúdio do Metallica posteriores ao "St. Anger" têm se mostrado uma brilhante sequência de acertos. Quando "Death Magnetic" pegou todo mundo de surpresa em 2008 e apresentou a banda com uma forma e fúria criativa que pareciam perdidas no passado, ninguém poderia imaginar que, oito anos depois, o Metallica lançaria um álbum ainda melhor. E foi o que aconteceu, quando em 2016 "Hardwired ... to Self Destruct" deixou todo mundo de queixo no chão e foi celebrado como o melhor álbum da banda desde os velhos tempos do mítico "Black Album".

Tendo esta retrospectiva dos fatos em mente, fica fácil entender que a expectativa dos fãs em relação ao novo "72 Seasons" estava num patamar muito mais alto do que em 2008 ou 2016. Verdade seja dita: conceber um trabalho à altura de "Hardwired ... to Self Destruct" não era tarefa fácil. Mas o Metallica surpreende novamente. Embora com uma proposta e sonoridade bastante próximas do disco de 2016, "72 Seasons" parece fadado a ser considerado por muitos como um álbum superior a "Hardwired ... to Self Destruct" ou, no mínimo, um trabalho no mesmo nível do anterior.

Aos fãs caberá decidir qual dos dois discos é o melhor, e obviamente bater o martelo em relação a esta questão invariavelmente irá envolver uma dose muito grande de gosto pessoal e subjetividade individual. O que pode ser apontado com mais tranquilidade é que "72 Seasons" se mostra um álbum muito mais regular e homogêneo do que "Hardwired...".

O disco de 2016 é ótimo, ninguém discute, mas o saldo geral do álbum era bastante irregular. Depois de seis faixas iniciais muito boas, o ouvinte passava por uma sequência de cinco músicas fraquíssimas ("Confusion", "ManUNkind", "Here Comes Revenge", "Am I Savage?" e "Murder One") até ser finalmente recompensado com a maravilhosa "Spit Out the Bone", que fecha o disco. Em contraste, "72 Seasons" apresenta 12 faixas com altos e baixos, mas que em nenhum momento deixam a peteca cair. Em seus melhores momentos, "72 Seasons" é no mínimo tão bom quanto "Hardwired...". Em seus momentos menos interessantes, ele ainda assim fica muito acima dos momentos mais fracos de "Hardwired...".

Em termos de sonoridade, por sua vez, "72 Seasons" mostra-se muito próximo do álbum anterior. A decisão não poderia ser mais acertada, já que "Hardwired..." soa definitivamente melhor do que tudo o que a banda lançou neste século antes de 2016. Neste novo álbum, é como se banda apostasse novamente na ótima sonoridade estabelecida em "Hardwired...", mas com o claro objetivo de superar o trabalho anterior em termos de composição. Pelo menos no que diz respeito ao todo, ao conjunto da obra, parece razoável apontar que a banda foi bem sucedida em sua proposta.

Assim como em "Hardwired...", o modelo que o Metallica busca emular em "72 Seasons" é bastante óbvio: o icônico "Black Album", supremo sucesso comercial da banda. Em outros tempos pós-1991, a banda mirou em objetivos criativos distintos. Na era "Load"/"Reload", buscou se afastar do ostracismo que ameaçava o heavy metal na época e tentou conceber uma fórmula de heavy rock mais comercial, mas ao mesmo tempo se afastando de qualquer tentação de ficar prisioneira da fórmula do "Black Album". Em "St.Anger", a banda tentou criar a sua própria versão do "new metal" que fazia sucesso na época (e, como todos sabemos, falhou miseravelmente em seu intento). No ótimo "Death Magnetic", a banda buscou inspiração no feeling e nas músicas longas, intrincadas e agressivas de "And Justice For All" (1988).

Em "Hardwired..." e no novo "72 Seasons", o objetivo é igualmente claro: revisitar a pegada do "Black Album" (com pitadas de referências a diversas outras fases da discografia da banda). Falta de criatividade? Esgotamento criativo? Autoplágio? Nada disso! Se um pouco de autorreferencialidade fosse pecado no rock, teríamos que condenar grande parte das discografias de monstros sagrados como Iron Maiden, AC/DC, Ramones, Judas Priest, Saxon, Megadeth e tantas outras lendas do hard e do heavy. Ao buscar inspiração na pegada do "Black Album", o Metallica não se perde no passado, mas sim presenteia seus fãs com um sólido conjunto de novas músicas que mostram a banda com uma vitalidade invejável.

O que temos em "72 Seasons" não é uma banda buscando revolucionar o estilo ou reinventar a roda (até porque o Metallica já fez isso várias vezes ao longo de sua carreira), mas sim um grupo com 40 anos de estrada trabalhando duro para mostrar que ainda está em ótima forma e que consegue entrar em campo e jogar em um nível semelhante ao seu poder criativo de outros tempos. Como estamos falando da maior banda de heavy metal de todos os tempos, isso não é pouca coisa. "72 Seasons" dá aos fãs do Metallica doze novos motivos para o coração headbanger seguir amando esta verdadeira instituição do rock.

E vamos à análise do novo disco, faixa por faixa!

 


1) 72 SEASONS: alternando diferentes velocidades ao longo da faixa, o Metallica abre o disco com a segunda música mais longa do play (perdendo apenas para "Inamorata", que fecha o álbum). A música que dá nome ao disco é uma mistura de heavy com levada thrash no refrão. Lembrando em alguns momentos a agressividade de músicas dos dois álbuns imediatamente anteriores a este novo, como "My Apocalypse" e "Spit out the Bone", a faixa mostra já de cara que a banda está em ótima forma e que não veio para brincar em serviço. Uma ótima abertura dos trabalhos. 


2) SHADOWS FOLLOW: a abertura de "72 Seasons", com uma faixa de mais de sete minutos, não poderia ser mais diferente da faixa de abertura ("Hardwired") do álbum anterior ("Hardwired ... to Self Destruct"). A segunda faixa do novo disco, por sua vez, lembra bastante "Atlas, Rise", segunda música daquele trabalho de 2016. Com uma levada e energia semelhantes, "Shadows Follow" também lembra em certos momentos a levada e o feeling de "Holier Than Thou" do "Black Album". 


3) SCREAMING SUICIDE: a terceira música eleva o nível do álbum e apresenta uma das melhores faixas do novo trabalho. O mix de hard com heavy metal tradicional chega no seu melhor momento até aqui, e de brinde Kirk entrega o seu segundo melhor solo do disco (perdendo apenas para "Chasing Light"). 


4) SLEEPWALK MY LIFE AGAIN: abrindo com um baixão nervoso, o riff das estrofes, a progressão e o ritmo da música evocam a clássica "Enter Sandman", embora o resultado final naturalmente não seja tão favorável. Com sua mistura de peso, batidas fortes e um andamento mais arrastado, bastaria uma mixagem que replicasse a sonoridade do "Black Album" para que a faixa ficasse inteiramente à vontade naquele álbum. 


5) YOU MUST BURN: falando no "Black Album", aqui a banda vai ainda mais fundo neste sentido e apresenta um instrumental que remete diretamente à clássica "Sad but True" daquele álbum. Alguns poderão achar que a música exagera no aspecto autorreferencial, mas a faixa é uma composição sólida e interessante o suficiente para escapar do rótulo de mero remake estilizado de "Sad but True". Os efeitos na voz de Hetfield durante o interlúdio fazem lembrar imediatamente de "Carpe Diem Baby" do álbum "Reload", de 1997. 


6) LUX ÆTERNA: é basicamente o "cartão de visitas" do novo álbum, tendo sido a primeira música de "72 Seasons" a ser liberada para o público. A faixa também tem a distinção de ser a música mais curta do novo disco (3:21 minutos) e a faixa com a levada mais rápida e thrash (junto com "Room of Mirrors"). Assim como "Too Far Goone", a composição tem uma sonoridade que remete ao heavy metal tradicional dos covers feitos pelo Metallica no "Garage Inc" de 1988. Sem dúvida, foi uma aposta segura da banda e tem potencial para agradar todos os tipos de fãs do Metallica. 

7) CROWN OF BARBED WIRE: uma mistura de heavy com hard rock, com uma pegada blues que remete aos riffs da fase "Load" e "Reload" - mas com sonoridade mais próxima do álbum anterior da banda ("Hardwired..."), de 2016. Marca um intervalo mais cadenciado no álbum, no meio de duas das faixas mais aceleradas e agressivas. 

8) CHASING LIGHT: uma das minhas faixas favoritas de "72 Seasons". Não é tão rápida quanto "Lux Æterna", mas mesmo assim é uma das músicas mais aceleradas do disco. O solo que Kirk apresenta aqui é simplesmente o melhor de todo o álbum. 

9) IF DARKNESS HAD A SON: a cadência da música remete à "Shortest Straw" do álbum "And Justice for All", com algumas levadas que também fazem lembrar de "Broken, Beat & Scared" do disco "Death Magnetic". 

10) TOO FAR GOONE: assim como "Lux Æterna", a música tem uma vibe que remete ao álbum de covers "Garage Inc". A faixa vai de um riff que lembra o cover do Metallica de "Blitzkrieg" (da banda de mesmo nome) até um refrão que quase parece saído de um punk rock. Com uma pegada de metal tradicional e riffs com dueto de guitarra, é a segunda faixa mais curta do álbum (perdendo apenas para "Lux Aeterna"). A música voa ao longo de seus 4:33 minutos e se destaca como uma das mais legais do novo disco. 


11) ROOM OF MIRRORS: junto com "Lux Æterna", é a música com a levada mais thrash metal do álbum. É uma boa faixa, mas não está à altura de composições em estilo semelhante da banda nos últimos álbuns de estúdio, como a maravilhosa "Spit Out the Bone" (do "Hardwired...") ou de "My Apocalypse" (do "Death Magnetic"). 


12) INAMORATA: a música que fecha o novo álbum do Metallica é algo fora da curva e simplesmente especial. Com a distinção de ser a composição mais longa de toda a história da banda, com 11:10 minutos, a proposta da faixa lembra um pouco aquelas longas músicas experimentais do Metallica na fase "Load" e "Reload" (como "Bleeding Me", "The Outlaw Torn" e "Fixxer") ao mesmo tempo em que dialoga diretamente (tanto liricamente quanto instrumentalmente) com a memorável "My Friend of Misery" do "Black Album". O resultado é maravilhosamente atmosférico e sintetiza perfeitamente o DNA da sonoridade do Metallica do "Black Album" até os dias atuais. O interlúdio no meio da faixa faz lembrar do feeling do cover "Loverman" (composição original de Nick Cave) no "Garage Inc". Tem tudo para ser uma futura "cult classic" entre os fãs da banda. É séria candidata à melhor música do álbum? Certamente (e a própria banda deixou gravada uma brincadeira neste sentido, após o término da música, antes do fim da faixa). É séria candidata à melhor música do Metallica do século XXI até agora? O tempo dirá.

Por fim, as minhas faixas favoritas (e ótimas sugestões para iniciar a degustação deste ótimo álbum): "Screaming Suicide", "You Must Burn", "Lux Æterna", "Chasing Light", "Too Far Gone" e "Inamorata".

quarta-feira, 30 de março de 2022

O Caveira resenha: URBAN WARRIORS (1987)

 


Para começo de conversa, quero deixar claro que não sou um novato quando o assunto é cinema italiano oitentista de ação pós-apocalíptica. Já tive o prazer de assistir várias das melhores pérolas deste gênero de gosto tão duvidoso, dentre as quais destaco 2019 - AFTER THE FALL OF NEW YORK, 1990 - THE BRONX WARRIORS, ESCAPE FROM THE BRONX, KERUAK - O EXTERMINADOR DE AÇO e ENDGAME

Estou ciente das principais falhas comuns entre as produções italianas daquele gênero e época, como pobreza de orçamento, roteiros rocambolescos e caráter derivativo em relação a produções norte-americanas referenciais como THE WARRIORS, ESCAPE FROM NEW YORK e MAD MAX 2. Conheço os defeitos, mas adoro essas "trasheiras" mesmo assim.

Dito isso, passo a esclarecer que este Urban Warriors é trash até para os padrões do cinema italiano de ação pós-apocalíptica dos anos 1980. Não acredita? Então confira esta resenha e tire suas próprias conclusões.

                                     
Urban Warriors, dirigido por Giuseppe Vari, foi lançado em 1987. Na trama, três técnicos, cientistas, engenheiros ou qualquer coisa do tipo estão trabalhando em um laboratório/instalação militar subterrânea. De repente, eles perdem todo o contato com a superfície e o estabelecimento fica completamente sem energia elétrica. Eles tentam sair do lugar, mas uma parte da estrutura sofre um desabamento, tornando impossível o acesso à saída e prendendo o trio no local. Depois de uma longa caminhada por túneis subterrâneos, eles acabam encontrando uma saída alternativa e finalmente chegam à superfície ... apenas para descobrir que uma guerra nuclear transformou tudo nas redondezas em um deserto desolado. Embora tal fato represente um choque para os personagens naquele momento, não há aqui nenhum "twist" para o espectador, que no começo do filme é apresentado a uma sequência de imagens de explosões nucleares misturadas com atividades vulcânicas (?), estragando qualquer possibilidade de surpresa.

O mundo pós-apocalíptico encontrado pelos protagonistas é bastante singular. Não vemos ruínas de prédios, nem destroços de veículos, nem corpos ou sinais de destruição urbana. Os "heróis" dão de cara com uma paisagem deserta de um lado, mas com vegetação preservada ao fundo (que explosão nuclear é essa que faz uma cidade desaparecer mas que preserva a grama?!?) e com duas estruturas intactas no horizonte. A primeira estrutura parece um conjunto de prédios sofisticados perfeitamente preservados. A outra parece uma precária instalação industrial abandonada. Para onde o trio de gênios da ciência resolve ir? Claaaaro, para o parque industrial inóspito! Fuck logics


No pátio industrial abandonado, os intrépidos sobreviventes encontram alguns alimentos enlatados e garantem um bom jantar pós-holocausto nuclear. Você poderia imaginar que, na vida real, três pessoas passando por uma experiência traumática dessas estariam simplesmente em choque e incapazes de comer ou dormir, não é mesmo? Bom, mas isso não se aplica para os cabras machos de Urban Warriors! A poeira nuclear ainda nem baixou e o nosso trio de heróis só pensa em dormir, comer, tomar cervejas e fazer piadas. É sério, eu juro! Os "heróis" lidam com o fim do mundo com a indiferença de alguém que foi pego de surpresa pelo imprevisto de um pneu furado ou de um celular sem bateria. Isso é o que eu chamo de um mindset otimizado para o pós-apocalipse!
 
                                              

Depois de umas cervejas e de um banquete de comida enlatada, o trio resolve dormir de novo (só para esclarecer: antes de chegarem à superfície, algumas horas antes disso, eles tinham dormido nada menos do que oito horas dentro da instalação subterrânea). Esses sujeitos são narcolépticos ou o quê? Nem filhote de gato dorme tanto assim!

                                                 

Depois da segunda noite de sono (em vinte minutos de filme!), o trio mais zen e relax que o fim-do-mundo já viu lida com uma sequência alarmante de novos acontecimentos. Primeiro, um dos cientistas se afasta dos outros para investigar um ruído na rua e desaparece. Posteriormente, seus colegas encontram apenas a cabeça do sujeito. Para variar, eles lidam com este chocante horror de forma aparentemente tranquila e indiferente - afinal de contas, o que é um amigo decapitado para quem lida de boas com o apocalipse nuclear, não é mesmo?

                                            

Em seguida, um dos cientistas encontra uma gravação em áudio feita por um desconhecido sobrevivente da guerra nuclear. Na gravação, a pessoa afirma que a radiação não apenas matou quase todo mundo como também causou algum tipo de mutação nos sobreviventes, tornando-os violentos e animalescos.

Peraí um pouco. Vamos tentar entender isso aí. Os caras estavam numa instalação subterrânea quando a guerra nuclear estourou. Eles levaram pouco mais de oito horas para chegar na superfície (sendo que passaram a maior parte deste tempo dormindo). Depois caminharam mais algumas horas e dormiram mais uma noite (depois de uma farra com cervejas e comida enlatada). Mas então quer dizer que o mundo acabou há menos de 24 horas e a civilização já foi substituída por um neobarbarismo estilo Mad Max, com maníacos enlouquecidos caçando outros sobreviventes de forma selvagem? E não apenas o mundo virou uma selva canibal em questão de poucas horas como deu tempo até de alguns sobreviventes registrarem o ocorrido em gravações de áudio? Isso aí é o "roteiro" de Urban Warriors?

                                           

Sim, é isso aí mesmo. Acredite se puder. Ah, e olha só que coisa curiosa: a radiação "enlouqueceu" parte dos sobreviventes, transformando-os em psicopatas homicidas sanguinários, mas não gerou nenhum tipo de lesão física aparente em ninguém! Que radiação mais diferentona esta, não é mesmo? Estou sendo irônico, é claro, pois fica evidente que a ideia da "radiação que afeta o psicológico mas não afeta o físico" foi apenas uma maneira de os realizadores deste filme pouparem uns trocados.

                                               

Mas voltemos à trama. Depois de tudo isso, os dois cientistas sobreviventes começam a ser ferozmente atacados por uma gangue de maníacos mutantes neobárbaros e, logo em seguida, uma violenta perseguição automobilística tem início (ohhhhh, quem poderia imaginar que isso iria acontecer em um clone italiano de Mad Max 2, né?). Tiros são trocados, motocicletas são espatifadas, mas a dupla de heróis remanescentes sobrevive. Então, entre uma troca de ideias e outra, eles chegam à conclusão de que nem todos os sobreviventes devem ter virado psicopatas homicidas e que devem ter sobrado algumas pessoas normais por aí em algum lugar. A dupla resolve procurar estes sobreviventes "do bem". Para tanto, eles elaboram o plano mais genial de todos os tempos: os dois resolvem SE SEPARAR para realizar as buscas!!! Fuck logics parte 2 - A Missão!!!


Não é brilhante? Afinal de contas, existe jeito melhor de encarar uma selva urbana pós-apocalíptica, repleta de maníacos tornados insanos por radiação nuclear, do que estando SOZINHO?

Esquadrão Classe Ai-que-merda!

Nestas idas e vindas, mais um dos cientistas é morto pelos neobárbaros atômicos, como já seria de se esperar. É isso que dá quando pesquisadores de laboratório subterrâneo resolvem brincar de Mad Max. Assim, dos três protagonistas do começo do filme, apenas um - Brad - sobrevive. "Coincidentemente", Brad é o mais fotogênico e galã do trio - tanto é que, no pôster do filme, ninguém fez questão de incluir nenhum dos outros dois cientistas. Pois é, o mundo não era fácil para os nerds nos anos 1980 - ainda mais quando rolava guerra atômica!

A essa altura do filme, já tivemos de tudo: guerra nuclear, motoqueiros mutantes, perseguições automobilísticas, trocas de tiros, dois cientistas trucidados, etc. Para uma plena e completa experiência trash/exploitation italiana oitentista, é claro que falta só mais uma coisa: nudez gratuita. É aí que uma tal de Julia aparece do nada no caminho de Brad e acaba seduzindo ele.

                                                   

Com sexo, cerveja e comida enlatada, Brad provavelmente deve ter pensado que o apocalipse nuclear até que não é lá tão ruim assim. Mas, como pão radioativo de pobre sempre cai com a manteiga atômica virada para o chão, Julia se revela uma integrante da gangue dos facínoras das estradas e entrega Brad nas mãos da horda de maníacos. Infelizmente para a ladina sirigaita, um dos trogloditas resolve matar ela ali mesmo, a troco de nada, em cinco segundos, porque sim. Ninguém liga.

                                               

Aprisionado pelos aloprados radioativos, Brad conhece Angela, que também escapou dos efeitos da radiação. Na sequência, Brad é julgado e condenado por um tribunal neobárbaro de pretensos representantes do povo. Mais uma vez, é notável ver como os sobreviventes malucos da guerra nuclear não apenas conseguiram se manter vivos como, também, criaram instituições, procedimentos jurídicos e conjuntos inteiros de novos costumes e regramentos sociais - tudo isso em questão de uns poucos dias. É muita eficiência! Me faz lembrar daquele antigo episódio de South Park em que os habitantes da cidade ficam presos dentro de um prédio e acabam recorrendo ao canibalismo para sobreviver, apesar do fato de serem libertados em questão de quatro ou cinco horas.

                                        

De volta ao filme. Depois de uma das piores cenas de "tribunal" da história do cinema, felizmente vemos nosso herói Brad recebendo ajuda de uma das integrantes da gangue e fugindo do seu cativeiro, levando Angela junto. O recém formado casal tem sucesso no confronto final com a gangue dos psicopatas atômicos e os dois sobreviventes partem juntos em busca de um futuro de esperança - e era isso: The End !

                                                     

Como você pode perceber, Urban Warriors é ruim. Indefensavelmente ruim. A produção é de uma pobreza franciscana, as atuações são amadoras, os diálogos são risíveis, as cenas em ambientes escuros são simplesmente um breu total, a ação é pobre e limitada e o pôster é muito mais legal e produzido do que o filme em si. Ao mesmo tempo, fãs do gênero invariavelmente irão se divertir com o humor involuntário e com as limitações técnicas dessa produção barata. 

                                          

Eu já assisti alguns filmes de orçamento magérrimo dentro do estilo sci-fi/action distópico dos anos 80 - como, por exemplo, o paupérrimo Endgame. Ainda assim, devo admitir que, em termos de pobreza e falta de orçamento, Urban Warriors supera qualquer coisa que eu já tenha visto até hoje neste gênero. Há algo de engraçado e divertido em ver Urban Warriors e perceber como é possível fazer um filme de ação distópica pós-apocalíptica com praticamente nenhuma verba. Sob este aspecto, pela ambição temática na comparação com a pobreza de orçamento e pelo que consegue entregar apesar da carência de recursos, de atores decentes e de um roteiro competente, fica difícil não sentir uma certa admiração e respeito pelo charme cara-de-pau de Urban Warriors.

Não se faz mais filmes assim. (In)felizmente?